O editor de "Opinião" do jornal "A Gazeta"
revela que a questão do diploma
do jornalista é irrelevante
Internet viabiliza maior participação dos usuários
Em entrevista concedida ao Grupo Interação o editor Irmo Gonring fala sobre o jornalismo cidadão e do papel da interação entre jornalista e colaborador. Ele pontua também sobre a questão da cobrança maior para quem exerce a profissão e lembra que Cristo não precisou escrever nem sequer uma palavra para transmitir uma mensagem forte que perpetua até os dias de hoje.
O jornalista define que os fóruns facilitou o estreitamento das relações entre leitor e jornalista, embora garanta que o capixaba ainda é tímido para dá a opinião. "Eles não gostam de se expor", diz Gonring. Entretanto, o fato do "anonimato" das respostas aos fóruns online possui a capacidade de fornecer um escudo ao leitor na medida em que agiliza o processo de interação entre emissor e receptor da mensagem.
O espaço para o cidadão divulgar suas idéias, sempre existiu, mas só agora com essa "proteção", com a facilidade do acesso e da comodidade que a Internet traz ao usuário foi possível enviar tudo pela Infovia. O jornalismo acrescenta que, dentro desse contexto, a ética deve ser o fator crucial para filtrar as informações válidas para a notícia.
Ele ainda fala sobre os blogs e sites independentes que, segundo informa, são viáveis desde que as pessoas saibam colocar pelo menos as vírgulas. "A curto prazo, me contentaria com isso", diz.
Irmo Gonring aconselha os futuros profissionais à ler livros de autores clássicos, ir ao teatro, ao balé, estudar inglês, cultivar plantas e aprender a respirar. Paralelamente, fala dos pontos positivos e negativos do jornalismo cidadão e conta que o diálogo entre cidadão e jornalista é essencial para sobrevivência de qualquer veículo de comunicação.
Confira a entrevista na íntegra aqui
1- A participação dos leitores através dos fóruns e opinião estimula o senso crítico dos cidadãos? Por quê?
Os fóruns têm mostrado que há um segmento dos leitores ávido por se expressar. De um modo geral, nossa experiência nos diz que o leitor capixaba interage pouco com o jornal, espontaneamente. Fala pelos corredores, comenta os assuntos no seu grupo, mas não gosta de se expor. Mas, se acionado por um questionamento, fica mais estimulado a participar. O fato do "anonimato" das respostas aos fóruns online talvez seja uma prova da necessidade desse escudo do leitor, ao dar sua opinião. Mas tudo isso é uma questão a se analisar com mais profundidade.
2 – Como era a participação do leitor antigamente? Era restrita?
Era espontânea. E, pelo dito acima, menor. Havia uns poucos que escreviam com freqüência.
3 – A que se deve esta abertura de espaço ao cidadão comum?
Sempre houve esse espaço. As pessoas é que pouco se utilizavam dele. É uma questão cultural. Com a internet, a facilidade de acionar uns comandos ajuda a superar a questão do comodismo, de escrever, ir ao correio, selar a carta, pagar. Isso vale ainda mais para os fóruns online, onde a pessoa entra em diálogo com o texto digitado por outra pessoa. A tecnologia favorece, então, essa interação do leitor com o jornal e com seu público leitor. Vejamos a "Foto do Leitor", que se beneficia da câmara digital e da possibilidade de enviar tudo pela infovia. Seria mais difícil, talvez impensável, sem as novas tecnologias.
4 - Como adequar os valores-notícias do jornalismo ao jornalismo cidadão? Como vocês filtram as mensagens dos leitores? O que é importante ou não para ser publicado como notícia?
Isso é muito difícil de explicar numa resposta rápida. Mas é a antiga e boa ética que deve ser o filtro. E pensar no que interessa aos vários públicos. O bom jornalismo sempre foi "cidadão", se feito por bons jornalistas, éticos, bem aparelhados tecnicamente. Bons jornalistas terão um horizonte mais amplo de cobertura e aprofundamento, para transformar Cartas de leitores, fotos enviadas, "notícias" (tudo isso é muito bem-vindo) em fragmentos a serem formatados dentro de um projeto editorial, que é um projeto filosófico, antes que tudo. Que é um compromisso e uma missão. Ou compromissos e missões, pois variam de veícullo para veículo, na saudável concorrência e na livre expressão das idéias. O cidadão vai ser um auxiliar, cada vez mais, de quem ocupa um espaço de consagração (o veículo que tem credibilidade). Cabe ao veículo separar esse material bruto, editá-lo, ligá-lo a uma tendência, ser, enfim, um "pensador", e não um reles repassador de fatos e impressões de leitores sobre o espetáculo do mundo.
5– Muitos blogs e sites são feitos por profissionais que não são formados em jornalismo e agora cogita-se uma lei, na qual todos podem escrever sem a necessidade do registro da categoria. Caso passe a vigorar, como fica o papel do jornalista? É possível dizer que o jornalismo cidadão desencadeou essa lei?
Não importa se terá ou não diploma. Cristo não tinha diploma e não escreveu uma palavra. Sua mensagem foi tão forte que ficou na memória e escreveram o que disse, tempos depois. Vivemos um momento de uma certa perplexidade que só tira o piso de quem pouco viveu ou pouco se informou. É uma hora de refletir, mais do que de dar opiniões. E parece que estão cobrando muito de quem faz jornalismo na prática. O tempo é que dirá. Quanto a mim, digo que as pessoas devem aprender a colocar as vírgulas. A curto prazo, me contentaria com isso.
6 – Com esta nova tendência do jornalismo participativo, o senhor acredita que daqui a alguns anos possa existir jornais impressos e virtuais feitos somente por jornalistas cidadãos? De que forma isso pode prejudicar o trabalho do jornalista?
Tudo pode acontecer. Quem me der uma resposta para essa questão, digo que é mau jornalista. Está blefando. Se alguém quiser um conselho, se quiser ser jornalista, se preparar para o futuro, qualquer que seja, leia os livros dos autores clássicos, vá ao teatro, ao balé. Cultive plantas, aprendar a respirar. Aprenda pelo menos inglês.
7 – Com relação à notícia alguns colaboradores implantam, de má-fé, informações errôneas na redação. Como o jornalismo pode se precaver para não ser alvo de proliferação de informações infundadas? Na redação já ocorreu algum fato desse gênero? Nesse caso, o leitor pode ser processado?
Já fazemos isso. Não pode haver ingênuos nas redações. O leitor pode ser processado e quem publicar, levar ao ar, etc., também. Cada vez mais serão necessários critérios de ética e de responsabilidade. E pessoas talentosas, nas redações.
8 – A participação do leitor, mesmo com esses problemas, é fundamental?
Sempre foi. O leitor sempre participou, mesmo não escrevendo uma linha. Foi ele que levou ao apogeu revistas como "O Cruzeiro" e "Manchete" e acabou com elas. Foi ele que elegeu e destituiu o "Jornal do Brasil". Nada aconteceu até agora sem o consentimento dele. O leitor silencioso será sempre nosso melhor parceiro. Aposto nele. Os barulhentos podem ajudar. Mas vão dar trabalho também. Teremos que ter perspicácia e um feeling especial para lidar com eles. Mas essa é a visão do veículo macro, do chamado "espaço de consagração", do qual a humanidade não não vai abrir mão. O micro terá sua natureza própria, a do pequeno grupo. Mas também terá suas normas. Tudo no mundo é ordenamento. Quem trafegar na marginalidade, mesmo assim terá que manter um código mínimo de diálogo com seus "stakeholders", para garantir sua sobrevivência, como ocorre em todos os guetos, mesmo que travestidos com a praticidadade e o glamour da infovia.
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Confira o vídeo sobre o jornalismo cidadão com Antônio Prada do Terra